quinta-feira, 6 de maio de 2010

Vou comprar um carro

Se precisar de um carro para me sentir poderoso, não preciso do carro, mas de um terapeuta

Finalmente me rendi aos apelos da sociedade e decidi comprar um carro. Estou cansado de pegar o elevador do meu prédio todos os dias para ir trabalhar, de bike, e ouvir: "Vai passear, hein!". Ou dizer com orgulho para crianças que não tenho carro, faço tudo de bicicleta e me perguntarem: "Mas você é pobre?".

Sempre ouvi que quem não tem um carro é um nada, que o carro traz status. Você não é o que come, mas sim o que dirige. Sem falar do fato de esta cidade parecer ser feita só para quem se desloca sobre quatro rodas. Portanto, com um carro vou me sentir um cidadão, algo que não consigo a pé, de bicicleta ou de transporte público.

Mas que carro comprar? Outro dia vi um documentário que falava sobre essa febre americana por utilitários, esses minitanques também conhecidos como SUV. Quando perguntado aos donos o motivo da escolha, a resposta era: "Com ele me sinto poderoso". Sério: se precisar de um carro para me sentir poderoso, não preciso de um carro, e sim de um terapeuta.

Quando tenho de dirigir um carro, pesa pensar que, graças às minhas aceleradas, estou despejando toneladas de fumaça na cara dos outros e ajudando a matar cerca de 20 pessoas por dia. Carro a álcool só é bom contra o aquecimento global; em compensação, polui mais que um a gasolina. Carros, só com os barulhentos e poluidores motores a combustão.

Mas existe um carro a ar comprimido. Compacto, desenvolvido por um ex-engenheiro da Fórmula 1, com autonomia de 300 km e necessidade de oito horas para recarregar na tomada comum ou 20 minutos numa "bomba" especial. O ar expelido do escapamento é mais limpo do que o que entra. O custo? Cerca de US$ 15 mil. Mas por que nenhuma montadora se interessa? Sugiro que assistam ao documentário Quem matou o carro elétrico? e verão que as próprias montadoras, que, por lei, foram obrigadas a fabricá-los, tiraram todos os carros de circulação assim que conseguiram derrubar a lei. Pelo visto, os interesses dos beneficiários dessa dependência dos combustíveis fósseis são mais fortes que nossa intenção de ter carros limpos.

Melhor desistir da ideia, ainda não inventaram um carro que eu compre sem peso na consciência. E, quando isso acontecer, ele vai ficar mais tempo na garagem, pois não estou a fim de contribuir para esse caos que vivemos, pois mesmo um carro "verde" congestiona.

Vou comprar um carro

(André Pasqualini Diretor-geral do CicloBR (andre@ciclobr.com.br)) 
DestakJornal

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